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terça-feira, 25 de janeiro de 2011

Quatro paredes

Levo esta história em minha mente há tanto tempo que já não me lembro os nomes dos personagens, mesmo se lembrasse, não seria da conta de ninguém. Chamemos então a traidora de Traídora, o traído de Traído e o carteiro de Carteiro.
Traídora era dessas mulheres que adorava receber corrrespondências e não negava isso a ninguém. O que poucas pessoas sabem é que o que ela gostava mesmo não era propriamente o conteúdo do envelope, mas sim o Carteiro que as levava até sua porta. Até a sua porta. Até a sua sala. Até a sua cozinha. E, por fim, até o seu quarto. Qualquer lugar é lugar, dizia ela. Assim todos os cômodos fizeram-se ninho de amor.
Para a sorte do casal (o casal de amantes e não o casal acasado), o horário que o carteiro passava coincidia com o horário em que Traído estava no trabalho, isso fez com que esse relacionamento clandestino durasse um pouco mais do que o esperado.

Até que...

Traído, como todo corno, era muito distraído. Acabou esquecendo em casa documentos que precisavam ser apresentados em uma reunião da empresa e só se deu conta disso minutos antes de começar. O único jeito era ir em casa e voltar o mais rápido possível, parecia uma boa ideia, mas mal sabia ele que se fosse para casa, não voltaria para a reunião.
Ao chegar em casa, Traído ouviu alguns gritos - ou seriam gemidos? foi díficil diferenciar - e correu para o quarto. Traídora, você está bem? Aconteceu alguma coisa? Ele perguntava sem saber se falava ou se era só o seu pensamento.
Abriu a porta.
O sangue quente de traídora gelou de imediato. Atônito, o casal (desta vez, o casado) se olhava como quem julga e como se envergonha.
- Puxa, vida, Traídora! Ufa, ainda bem que fui eu. Imagina se fosse outra pessoa?
E o coração de Traídora amorneceu.

segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Conjugável

Explodir
Verbo defectivo
Porque eu não explodo
Tu não explodes
E o homem bomba
Não sobrevive pra conjugar

terça-feira, 4 de janeiro de 2011

Pulseiras, corações e cartinhas de amor.

Logo ele, que zombava dos amigos que se diziam apaixonados, estava ali, na minha frente, me oferecendo uma carta de amor, que havia mais corações desenhados do que palavras escritas e junto com ela uma linda pulseirinha de artesanato, baratinha, aposto, mas se você conhecesse o Marco como eu conheci, saberia que ele era um pobre fodido e se perguntaria de quem ele roubara aquilo. Não é exagero, passei todos os intervalos com ele durante 3 meses e nunca o vi com uma moeda furada. Os seus olhos imploravam para que eu os recebesse com agrado. Aceitar aquilo era o mesmo que aceitar seu coração.

E eu estava sozinha demais para recusar.

Depois eu fui embora do país dele, não era o meu lugar, voltei pra casa, não disse nem “tchau”. Por outro lado, não tive culpa, Marco sempre fora um socialista forçado, não tinha celular nem acesso a internet, tudo isso no final de 2009, parece improvável, mas acontece.

Menos de um mês depois de ter chegado, estava eu no banco de uma praça conversando e mexendo na tal pulseira quando ela se partiu e todas as continhas se espalharam pelo chão de um jeito que seria impossível o resgate de todas. Senti muito.

O que me levou a escrever sobre tudo isso foi que, na semana passada, olhando umas barracas de artesanato eu vi, entre tantas, uma única pulseira idêntica à que o Marco me deu. Quase havia me esquecido o quanto ela é linda! Paguei oito reais para apagar da minha memória o dia em que quebrei aquela pulseira e a levo comigo como se nunca tivesse saído do meu braço. Quem me dera achar por aí também um coração à venda, assim faria o mesmo, o compraria e colocaria no lugar do que parti quando voltei.